Case: STJ extingue Ação de Improbidade Administrativa com base na nova lei

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Atualizado: 15/05/2025
STJ extingue Ação de Improbidade Administrativa com base na nova lei

Entenda o motivo pelo qual o STJ extingue Ação de Improbidade Administrativa com base na nova lei, Lei nº 14.230/2021, no âmbito do Recurso Especial nº 2197893 - SP, sob a relatoria do Ministro Afrânio Vilela, que reacendeu debates cruciais sobre a aplicação da Nova Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 14.230/2021).

O caso, envolvendo um ex-Diretor de Câmara Municipal, culminou na extinção de uma ação civil pública por improbidade administrativa. O caso foi capitaneado pelo escritório Duarte e Almeida Advogados.

A decisão fundamentou-se na atipicidade da conduta do réu frente às novas exigências legais, especialmente a necessidade de comprovação de dolo específico para caracterizar o ato ímprobo.

Esta análise se propõe a destrinchar os fundamentos dessa decisão, seus reflexos no ordenamento jurídico e as implicações para a gestão pública e o combate à corrupção no Brasil.

Entenda mais sobre a decisão.

Entenda o caso: de Diretor de Câmara a réu por improbidade administrativa

A controvérsia originou-se de uma ação de responsabilidade civil por ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra um ex-agente público.

Alegava-se que o réu, na condição de Diretor Geral da Câmara Municipal de Tanabi, teria se valido do cargo para acessar documentos pessoais de servidores e, com base neles, celebrar contratos de mútuo em nome desses servidores, sem a devida autorização.

A conduta foi inicialmente enquadrada como violação aos princípios da administração pública, notadamente os deveres de honestidade e legalidade, previstos no artigo 11 da Lei nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa - LIA), em sua redação original.

Em primeira instância, a sentença julgou improcedentes os pedidos, já sob a ótica das alterações trazidas pela Lei nº 14.230/2021, que modificou substancialmente a LIA.

O juízo entendeu que a conduta imputada não se subsumia às hipóteses legais do novo rol taxativo do artigo 11.

Contudo, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), ao julgar a apelação do Ministério Público, reformou a sentença.

O TJSP considerou que o entendimento de retroatividade firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema nº 1.199 não deveria ser aplicado irrestritamente aos casos fundados no artigo 11, caput, e inciso I, da LIA (redação original).

Para o tribunal paulista, a retroatividade não abarcaria atos praticados na vigência da redação original da LIA que se enquadravam nessas hipóteses, ressalvada a necessidade de dolo.

Assim, concluiu pela demonstração do ato ímprobo e do dolo na conduta do réu, aplicando as penas de perda da função pública e suspensão dos direitos políticos por três anos, conforme o artigo 12, III, da LIA (redação da época dos fatos).

A virada no STJ: a prevalência da Nova LIA e a extinção da ação civil pública

a prevalência da Nova LIA e a extinção da ação civil pública
Representação em gráfico da prevalência da Nova LIA e a extinção da ação civil pública

Inconformado, o réu interpôs Recurso Especial ao STJ, alegando violação a dispositivos da Lei nº 8.429/1992, já com as alterações da Lei nº 14.230/2021.

O Ministro Relator Afrânio Vilela, em decisão monocrática, deu provimento ao recurso para declarar extinta a ação civil pública por atipicidade da conduta.

A decisão do STJ fundamentou-se em dois pilares principais, alinhados com a jurisprudência consolidada do STF e do próprio STJ acerca da Nova Lei de Improbidade:

  1. A Necessidade de Dolo Específico e a Retroatividade da Norma Benéfica: O Ministro relembrou as teses fixadas pelo STF no Tema 1.199 da Repercussão Geral:
    • Exigência de comprovação de responsabilidade subjetiva, com a presença do elemento dolo para a tipificação dos atos de improbidade dos artigos 9º, 10 e 11 da LIA. A irretroatividade da norma benéfica da Lei 14.230/2021 (revogação da modalidade culposa) em relação à coisa julgada e durante a execução das penas.A aplicabilidade da nova lei aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior, sem condenação transitada em julgado, devendo o juízo analisar eventual dolo.A irretroatividade do novo regime prescricional, aplicando-se os novos marcos a partir da publicação da lei.
    O STJ tem compreendido que as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021 ao artigo 11 da LIA (que passou a exigir um rol taxativo de condutas e não mais uma cláusula geral de violação a princípios) aplicam-se aos atos praticados na vigência do texto anterior, desde que não haja condenação transitada em julgado.
  2. Atipicidade da Conduta Frente ao Novo Rol Taxativo do Artigo 11: Este foi o ponto crucial para a extinção da ação no caso concreto. O Ministro Vilela destacou o entendimento pacificado de que a condenação com base em genérica violação a princípios administrativos, sem a tipificação em uma das figuras expressamente previstas nos incisos do novo artigo 11 da LIA, ou com base nos revogados incisos I e II do mesmo artigo (que eram mais abertos), leva à "abolição da tipicidade da conduta" (abolitio criminis, em analogia ao direito penal) e, consequentemente, à improcedência dos pedidos.No caso do réu, a condenação em segunda instância havia se baseado no artigo 11, caput, da LIA (redação original), reconhecendo apenas o dolo genérico. A conduta, da forma como descrita no acórdão do TJSP, não se enquadrava em nenhuma das hipóteses taxativas do novo artigo 11.
  3. Alteração das Sanções Aplicáveis: Mesmo que a conduta fosse considerada típica – o que não ocorreu –, o Ministro ressaltou que as penalidades de perda da função pública e suspensão dos direitos políticos foram retiradas pela Lei 14.230/2021 para os atos de improbidade que atentam contra os princípios da administração pública (artigo 11). O novo artigo 12, III, prevê apenas a sanção de multa para essas hipóteses.

Análise técnica da Decisão do STJ e suas implicações jurídicas

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Representação de um advogado analisando a decisão do STJ que extinguiu Ação de Improbidade Administrativa com base na nova lei

A decisão do Ministro Afrânio Vilela é tecnicamente irretocável e reflete a consolidação da interpretação dos tribunais superiores sobre a Nova Lei de Improbidade Administrativa.

Alguns pontos merecem destaque:

  • Segurança Jurídica e Legalidade Estrita: A Lei nº 14.230/2021 buscou trazer maior segurança jurídica ao sistema de improbidade, afastando interpretações excessivamente abertas que, por vezes, criminalizavam a mera irregularidade administrativa ou o erro inescusável, sem a comprovação de má-fé qualificada. A exigência de dolo específico (a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado) e a taxatividade do rol do artigo 11 são expressões dessa busca por legalidade estrita.
  • O Fim da "Improbidade por Princípio Genérico": A principal mudança, e que impactou diretamente o caso em análise, é o fim da condenação por violação genérica aos princípios da administração pública. Antes, o caput do artigo 11, combinado com seus incisos exemplificativos, permitia uma margem maior de enquadramento. Agora, a conduta deve se amoldar a uma das descrições típicas dos incisos do artigo 11, que foram significativamente restringidos e detalhados.
  • Impacto em Processos em Curso: A decisão reforça que, para os processos em andamento sem trânsito em julgado, é imperativo reanalisar as condutas imputadas sob a nova legislação. Se o fato, mesmo doloso, não se encaixar no novo rol taxativo do artigo 11, ou se não houver comprovação do dolo específico (e não apenas genérico), a tendência é a improcedência da ação ou, como no caso, sua extinção por atipicidade.
  • O Papel do Advogado Especialista em Improbidade Administrativa: Casos como este demonstram a importância crucial de uma defesa técnica especializada em improbidade administrativa e atualizada com as constantes evoluções legislativas e jurisprudenciais. A atuação do escritório Duarte e Almeida Advogados, ao levar a questão ao STJ e obter o provimento do recurso, evidencia como o conhecimento aprofundado da matéria pode ser determinante para o desfecho de uma ação de improbidade.
  • Desafios para o Combate à Corrupção: Críticos da Nova LIA argumentam que as alterações podem dificultar o combate à corrupção, ao restringir o alcance da lei. Por outro lado, é importante destacar que a lei anterior gerava insegurança e abria espaço para perseguições indevidas, e que a nova legislação foca em condutas mais graves e intencionalmente lesivas. O equilíbrio entre garantir a punição de atos efetivamente ímprobos e proteger o gestor público de boa-fé de acusações infundadas é um desafio constante que um advogado especialista deve ter como ponto a ser superado.

Conclusão

A decisão no REsp nº 2197893 - SP, que resultou na extinção da ação de improbidade administrativa, é um marco ilustrativo da profunda transformação operada pela Lei nº 14.230/2021 no microssistema de improbidade administrativa.

A exigência de dolo específico, a taxatividade das condutas do artigo 11 – cruciais para a atipicidade da conduta imputada a Mazza Junior – e a retroatividade da lei mais benéfica (exceto para casos transitados em julgado) são agora elementos consolidados na jurisprudência, como demonstrado neste julgamento.

Para os operadores do Direito, gestores públicos e a sociedade em geral, o caso em tela serve como um claro exemplo de que o combate à improbidade administrativa continua, mas sob novas e mais estritas balizas legais que demandam rigor na tipificação das condutas e na comprovação do dolo específico.

A decisão do STJ no REsp nº 2197893 - SP, ao extinguir a ação contra o ex-diretor por atipicidade, não representa leniência com a má gestão, mas sim a aplicação técnica e estrita do novo regramento legal ao caso concreto, buscando conciliar a repressão à corrupção com a garantia da segurança jurídica e do devido processo legal.

O sucesso na defesa do réu, conduzida pelo escritório Duarte e Almeida Advogados, evidencia como a atuação jurídica especializada é crucial para navegar com êxito o cenário de reinterpretação e adaptação imposto pela Nova Lei de Improbidade.

Qual foi o caso analisado pelo STJ no REsp nº 2197893 - SP?

O caso envolveu um ex-Diretor Geral da Câmara Municipal de Tanabi, acusado de usar o cargo para acessar documentos de servidores e realizar empréstimos em nome deles sem autorização. O STJ analisou se essa conduta configuraria improbidade administrativa sob a Nova Lei de Improbidade (Lei nº 14.230/2021).

Qual foi a decisão final do STJ neste caso e por quê?

O STJ decidiu extinguir a ação de improbidade administrativa contra o réu. A principal razão foi a atipicidade da conduta, ou seja, o ato praticado não se enquadrou nas hipóteses taxativas do novo artigo 11 da Lei de Improbidade Administrativa, que exige dolo específico, não apenas genérico, para a configuração do ato ímprobo.

Como a decisão do STJ neste caso afeta outros processos de improbidade administrativa?

A decisão reforça a interpretação consolidada de que a Nova Lei de Improbidade se aplica a processos em curso sem trânsito em julgado. Isso significa que condutas que não se amoldem estritamente ao novo rol taxativo do artigo 11 ou para as quais não se comprove o dolo específico tendem a ser julgadas improcedentes ou extintas por atipicidade, como ocorreu no caso analisado.

Quais foram os principais fundamentos do STJ para extinguir a ação de improbidade administrativa?

Os principais fundamentos foram: a necessidade de comprovação de dolo específico (e não apenas genérico); a atipicidade da conduta do réu frente ao novo rol taxativo do artigo 11 da LIA (alterado pela Lei 14.230/2021); e o fato de que, mesmo se a conduta fosse típica, as sanções de perda da função pública e suspensão dos direitos políticos foram retiradas pela nova lei para atos do artigo 11.

Autores

  • Foto de perfil - Ricardo Duarte Jr.

    Advogado e sócio-fundador do escritório Duarte e Almeida Advogados. Com uma sólida formação acadêmica, é professor universitário na UNI-RN e UFRN, além de doutor em Direito Público pela FDUL. Possui mestrado em Direito Público e especialização em Direito Administrativo pela UFRN e é especialista em Direito Constitucional e Tributário pela UnP. Autor de livros sobre Improbidade Administrativa, Ricardo também é presidente e membro fundador do IDASF. Fora do ambiente jurídico, ele é pai dedicado e corredor entusiasta, buscando sempre equilibrar a vida profissional e pessoal.

  • Foto de perfil - Raphael de Almeida

    Advogado, sócio-fundador e administrador do Duarte e Almeida Advogados, com especialização em Direito Civil e Processual Civil pela UFRN, além de Direito Constitucional e Tributário pela UnP. Com uma sólida atuação na advocacia, é membro fundador e conselheiro fiscal do Instituto de Direito Administrativo Seabra Fagundes (IDASF), contribuindo para o fortalecimento do direito administrativo no Brasil. Além de suas conquistas profissionais, é pai dedicado e triatleta amador, equilibrando suas paixões pelo esporte de alto rendimento e pela família com sua carreira jurídica.

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